Doces pecados e livramento de Deus

É comum numa empresa em que trabalhei adotar o que se chama de motoboy comunitário. Um dia da semana é selecionado para usar um motoboy a fim de resolver problemas e dar aquela mãozinha para ajudar os funcionários, em algumas atividades. Um serviço muito bom e fundamental disponibilizado por empresas que pensam no bem estar de seus funcionários.

Trabalhei nessa empresa e confesso que tenho saudades. Saudades do bom ambiente, da harmonia buscada no dia a dia e no prazer de trabalhar no que mais amo, que é a área de eventos. Por quase 9 anos desfrutei deste prazer.

Pois bem, a pessoa que venho chamando neste blog de alma boa usou desse serviço para abençoar minha vida. Vários foram os dias de quarta-feira em que recebi as mais diversas manifestações e formas de carinho, de vários colegas. A alma boa canalizou e movimentou amigos para me abençoar através deste serviço.

Na quarta-feira, dia 17 de outubro eu estava me arrumando e como sempre, na costumeira dificuldade de lidar com a tontura, pois eu fazia as mais diversas atividades como: sair do banho, me secar, me vestir, "dar um tapinha na cara" (dando um jeitinho no visual - se é que tem jeito para isso...rs), colocar comida para o Spike, colocar água...e continuar correndo...desligar o gás, o rádio, checar os documentos para o compromisso médico, etc...ufa...Fazer tudo isso me deixa tontinha pois envolve andar, girar, correr, agachar, levantar, sentar...é muito movimento para uma cabeça só...(e cabeça esta, que agora está com defeito - ou como dizem "com uma cicatriz").

Enfim saí pela porta e fui até o barzinho me alimentar, afinal estou tentando seguir à risca a alimentação de 3 em 3 horas. O horário já estava vencido, era tempo suficiente para almoçar voltar e pegar toda a "tralha" (bolsa, remédios, documentos, etc) para ir à mais uma rotina médica.

Almocei e voltei correndo (leia-se: andando como uma patinha fugindo de um predador). Ao entrar no prédio o zelador me disse "deixaram um presentinho pra você"...eu respondi "obrigada", já chegando em minha porta e avistando uma sacolinha vermelha com uma graciosa palavra escrita: Kopenhagen...Ahhhh...Nunca foi tão bom ler essa palavra, essa marca...só ler a palavra já me deixou com água na boca...até agora escrever sobre isso já me deixa salivando...

Entrei em casa pensando no meu atraso, no metrô que eu teria de enfrentar e no conteúdo da sacola...abri e vi uma linda caixinha embrulhada com papel da Kopenhagen e com laço vermelho...minha vontade naquela hora era rasgar tudo e devorar o conteúdo; eu já sabia o que era: se foi entregue numa quarta-feira, era o motoboy comunitário da Abendi, se era da Kopenhagen era um presente da Eliene que havia me prometido que eu experimentaria o sabor de uma verdadeira Nhá Benta. A Nhá Benta da Kopenhagen! Na hora pensei...que linda! Ela lembrou! Que bom!

Com a sacola em mãos pensei em deixar no sofá, depois lembrei do Spike (meu peludo de 4 patas), peguei minha "tralha" e deixei na cadeira...estava indo embora e lembrei "na cadeira não!!!"...voltei e coloquei a sacola no centro da mesa de jantar, na sala....pensei "impossível ele subir aqui"...corri e saí pela porta atrasada para meu compromisso médico.

Era rua, farol, buracos, escadarias, 3 linhas de metrô cheias e a patinha alucinada foi-se para seu compromisso, naquele dia, na Vila Mariana. A rotina médica daquele dia envolvia condicionamento físico, fisioterapia, terapia ocupacional e nutrição. E a patinha chegou ao seu destino...esbaforida e pensando na caixinha de Nhá Benta que devoraria ao final daquele dia.

A maior surpresa daquela rotina médica estaria para sempre na minha memória, na 1 hora de esclarecimentos e ensinamentos sobre nutrição. Contei para minha nutricionista que eu havia sido diagnosticada com diabete. Pra quê. Tive  uma aula sobre o assunto. Aprendi a causa, as consequências, os alertas, aprendi tudo...ao final confessei à ela: "ganhei hoje uma caixa de Nhá Benta da Kopenhagen!!!", e ela me respondeu: "ótimo, dê de presente para alguém...", na maior normalidade, quase chorei como criança...

Saí daquela sala pensando no presente que havia ganho da minha amiga. Pensei no gosto, no cheiro, na maciez das mordidas que eu poderia dar naqueles docinhos tão fofinhos. Ahhh meu Deus...só de escrever e de relembrar me dá agonia...

Voltei para casa pensando em como poderia agradecer pelo presente que eu não poderia desgutar. Era a aula de nutrição, a diabete (ou a "Tia Beth") na minha cabeça...era o pensamento que o Philippe já poderia estar em casa e aguçado pela curiosidade, estaria devorando meu presente...Eu não sabia direito o que pensar. Eu havia ganho algo que não poderia usufruir? Como assim? Que tortura!!

Como de costume ao chegar no metrô próximo à minha casa, liguei para o Philippe afim de checar se já havia chegado e se poderia me buscar no metrô. Prontamente ele atendeu. Pedi a ajuda de costume e nos encontramos. Fomos comer alguma coisa no barzinho e eu aproveitaria para relatar a ele o que eu havia aprendido naquela tarde.

Chegamos ao barzinho e conversamos sobre minha aula de nutrição e sobre minha tarde em geral. Comentei "justo hoje que aprendi tudo isso, ganhei um presente da Kopenhagen"...ele balançou a cabeça como forma de questionamento. E eu perguntei "quando você chegou em casa, viu uma sacola vermelha sobre a mesa?"...ele respondeu "eu cheguei e vi um monte de papel picado no chão" e ele completou "juntei tudo e joguei fora". Fiquei sem reação...perguntei "vai me dizer que o Spike comeu meu presente!!!"...e na maior inocência meu filho sem entender deu de ombros...

Ao chegar em casa comprovei a suspeita. No canto da sala estava a caixa de Nhá Benta. Eu não sabia se ficava furiosa ou se refletia no significado daquela situação. Mas eu sabia que poderia ter tido uma crise de hiperglicemia se eu tivesse devorado aquelas delícias. Eu queria brigar com o Spike, mas ao mesmo tempo reconhecia a mão de Deus naquela situação...

Continua sendo meu sonho comer uma dessas

Eu brigava com meu lindo e fiel escudeiro, ralhava com meu amigo e diabolicamente inocente poodle branquinho..."como você fez isso!!?", mostrando a caixa encontrada como evidência do crime cometido..."como!!?"...ele enfiava o focinho no meio das patinhas sabendo que havia feito besteira. Como sempre muito inteligente, ele estava consciente do crime, do delito cometido...mas no fim eu sabia que não havia coincidências...pois aprendi ao longo da vida que em tudo há a onisciência de Deus.

Eliene, linda, agradeço seu gesto e quero que saiba que em minha mente eu dei cada mordida naquelas delícias, comi cada Nhá Benta com minha imaginação e com minha criatividade, mas me faltaram neurônios especiais para meu paladar sentir toda a textura e doçura daqueles pecados.

Um beijo no coração.
da sua amiga Anne

Almas boas renovando outras almas. Quem se candidata?

É notável como o ser humano tem capacidade de reconstruir, sejam prédios, pontes ou cidades quando necessário.

Simplesmente conseguem a transformação do caos em obras gigantescas e admiráveis. Quer exemplos? Durante a Segunda Grande Guerra, muitas cidades foram completamente destruídas, na Europa, no Japão então, tivemos uma tragédia maior ainda. Quando acontecem as grandes tragédias naturais como terremotos, Tsunamis ou como em um episódio recente na América no WTC.

Em pouco tempo as pessoas absorvem a dor pela perda das vidas e acontece um fenômeno da reconstrução. Onde prédios são reerguidos, com mais graça que os anteriores. Entendo que, quando se trata da reconstrução material pura e simplesmente acontecem milagres. Pessoas que algumas vezes nem se conhecem, acabam se unindo em torno de uma CAUSA e reconstroem.

Mas quando a reconstrução se trata única e exclusivamente de um ser humano? O que pode ser feito para ajudar?

Sim, existem pessoas e todos nós passamos por momentos, situações que necessitamos de nos reconstruirmos. Em diversos aspectos. Pode ser um relacionamento que desmoronou, um trabalho perdido, um familiar que nos deixou. Enfim são inúmeros os momentos em que é preciso limpar o terreno dos escombros, buscar uma nova planta e começar a reconstrução.

Nessas horas é que contamos, ou melhor, necessitamos do apoio de amigos, daquelas pessoas que abrem mão de alguns afazeres para estender suas mãos em nossa direção e contribuem nessa reconstrução.

É obvio que nessa obra não ficará um monumento à união, a capacidade empreendedora, em forma de prédios para serem admirados. Fica simplesmente um gesto de gratidão, uma alma renovada, habitando um novo ser humano.

A pergunta que fica no final desta reflexão, é: Até que ponto, nós nos dispomos a ajudar na reconstrução de outro ser humano?

Pense nisso...
de Sigmar Sabin